Quarta-feira, 31 de Dezembro de 2008

OS MEDIA SEGUNDO MICHELE HILMES (II)

[continuação da mensagem de ontem]

O quarto capítulo decorre de 1940 a 1945, no que Michele Hilmes chamou de guerra em casa e no estrangeiro. Na realidade, a rádio tomara parte no conflito da segunda guerra mundial – em termos do medo dado pelo elevado uso da propaganda na nova tecnologia e em termos do seu potencial para apoiar, informar e unir o público americano em tempos difíceis. A rádio cimentou o papel cooperativo.

Muito do interesse face à rádio envolveu ideias sobre audiência. A pergunta foi: podia a rádio criar um público de massa susceptível e facilmente manipulável? Ou a rádio tinha um poder racional para informar decisões a um grupo de indivíduos em termos de informação e opinião?

Em tempos de guerra, a rádio definiu as oportunidades de defender o que se entendia por correcto e marginalizar os grupos opressores e os aspectos de desigualdade e antidemocracia da vida americana. Pela primeira vez, surgiram programas sobre o racismo, o que conduziu ao posterior movimento dos direitos civis. Outros programas recrutaram mulheres americanas que definiram uma nova esfera de serviço público e trabalho remunerado.

Era o tempo do aparecimento e novidade da televisão. Esta queria preencher as promessas da rádio, entretanto abandonadas – a luz que brilha no centro do lar, a utopia da igualdade e do conhecimento. Os amadores da televisão, longe de serem os indivíduos inventivos das garagens e dos sótãos, eram engenheiros e cientistas nos laboratórios da RCA, CBS e General Electrics.

O quinto capítulo, de 1945 a 1955, seria o da exploração da televisão. Do ponto de vista político, o presidente Roosevelt, que levou os americanos a ultrapassarem a Depressão e a segunda guerra mundial, morreu um mês antes do conflito terminar. Foi o vice-presidente Truman e outros aliados que assinaram o tratado. Os custos haviam sido elevados: entre 35 e 50 milhões de pessoas tinham morrido, a maior parte das cidades europeias estava em ruínas, as indústrias e os sistemas de transportes tinham sido destruídos. Por seu lado, formava-se a União Soviética, começando a Guerra Fria.

A televisão desempenhou um papel de ligação nas salas e quartos dos lares americanos. Desde o começo dominada pelas forças da grande indústria, nunca se duvidou que a televisão desenvolveria as linhas de um sistema comercial, controlado por redes e pela publicidade. A televisão prometia uma nação normalizada e com bons indicadores de vida. Consolidou-se uma atmosfera de regulação, com a atribuição de licenças. Os programas de televisão imitavam muitos dos formatos da rádio. Esta ficava pobre, por um lado, mas livre para desenvolver novos géneros, por outro. Caso das práticas de minorias étnicas, como os negros, visível nos anos subsequentes, com a explosão de novos ritmos e estéticas: música negra e rock’n’roll. O DJ emerge como o motor dessa transformação.

Na televisão, foram lançadas dezenas de carreiras e estrelas, a idade de ouro do meio. Concertos, westerns, comédias de situação (sitcom) prosperaram. Em especial a sitcom desenvolvida muito por estrelas femininas vindas da rádio trouxe a voz das mulheres ao prime time da televisão. As notícias experimentavam e adaptavam-se às necessidades visuais da televisão.

Mas nem tudo foram rosas. Os receios dos efeitos nas crianças alargaram-se nas duas décadas seguintes, com os dirigentes do audiovisual a serem responsabilizados pelo interesse público, uma retórica que se alargou até hoje. Isto numa altura de forte concorrência tecnológica como a da televisão hertziana e a televisão paga (cabo, satélite). O sistema clássico, de pouca oferta de programas, foi ameaçado pela oferta multicanal. A televisão, apesar de tudo, tomava o centro do lar americano.

O sexto episódio, no decurso de 1955 a 1965, foi designado por Hilmes por o meio domesticado. O período de finais da década de 1950 e começo da década seguinte é lembrado como um período de tranquilidade, domesticidade e normalidade. Contudo, para a televisão foi um tempo turbulento e formativo. Também uma onda de corrupção chegou ao conhecimento da FCC, o que levou a uma nova era de regulação.

Nascia o sistema estável da televisão, com as redes clássicas americanas que durariam 20 anos e produziam o que se chama agora de programas de exportação mundial. Os anos de 1950 representam um período de constituição de famílias suburbanas com poder de compra mais elevado e marcadas pelo liberalismo empresarial, pelo aparecimento dos adolescentes como segmento demográfico e pela era da televisão para toda a família, que se alargou na década de 1960. Ora, o que achamos dos anos de 1960 – movimentos juvenis, disrupção social, programação social mais relevante – só acontece nos finais dessa década.

Os anos de 1955 a 1965 são marcados pela investigação e debate da regulação, e escândalos na programação radiofónica e na indústria dos concursos, e por um período de consolidação e estandardização nas estruturas e programas da televisão, parte e parcela de uma forte mudança social. A televisão era, agora, a arena central da vida privada e pública, alargando-se o debate sobre o seu papel social. O assassinato do presidente Kennedy (22 de Novembro de 1963) foi seguido na televisão e na memória ficaram as lágrimas do apresentador Walter Conkrite a narrar o triste acontecimento.

[continua]
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publicado por industrias-culturais às 09:37
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