Sexta-feira, 10 de Abril de 2015
Além do moderno museu onde se pode ver a obra de José de Guimarães, a cidade possui dois museus muito interessantes, o museu de Martins Sarmento (1895, dedicado a indústrias pré-históricas) e o museu de Alberto Sampaio (1928, com talha, pintura, como o fresco
Degolação de São João Baptista, e escultura, com muitas obras provenientes de igrejas da região). Relevo, pela magnífica apresentação, o segundo museu. Manifesto tristeza pela exposição, ultrapassada em termos museológicos, o primeiro. Isso repercute-se até na alegria e/ou afastamento no atendimento.
Quarta-feira, 4 de Março de 2015
O circo adaptou-se. Já não monta a tenda e exibe leões ou outros animais selvagens mas mostra-se em salas multiusos dos concelhos do país. Uma apresentadora, com música de fundo, a ginasta, o palhaço e figuras do audiovisual como o Rato Mickey e a sua namorada Minnie, mais umas canções actuais da televisão que o público infantil conhece e canta, e correntes de fumo colorido, constituem um repertório que apela para as indústrias culturais e preenche um serão agradável. No espectáculo, houve ainda uma prova com crianças no palco, chamados a fazer umas habilidades simples, e outra prova com quatro pais. Estes, sentados em cadeiras e inclinados (quase deitados) sobre cada um deles, foram sentindo que o palhaço lhes tirava cadeira a cadeira. O equilíbrio foi ficando precário, até se estatelarem no chão, o que provocou um riso maior do que anteriores ocasiões.
Num dado momento, veio o Transformer, um robô gigante de ar ameaçador, movendo-se lentamente. Após a exibição, seguiu-se o intervalo, aproveitado para fazer fotografias ao lado do robô. Todas as crianças quiseram ficar ao lado do robô, que a organização do circo se serviu para cobrar algum dinheiro pelo momento. Mas o rapazinho da imagem, mesmo com a ajuda do pai, sentiu-se intimidado. Talvez ele compreendesse o que o monstro dizia em inglês, qualquer coisa como "eu vou destruir a raça humana".
Segunda-feira, 2 de Março de 2015
Visita guiada na próxima 4ª feira, dia 3 de Março, às 18:30, por Isabel Gil à exposição de Daniel Blaufuks Toda a Memória do Mundo, Parte 1 (Museu Nacional de Arte Contemporânea, Chiado).
Terça-feira, 24 de Fevereiro de 2015
"No studioteambox, março é mês de Mr. Fields, com o artista a trazer-nos um conjunto de gravuras e desenhos que forma a exposição Playground.Com Playground, o circo volta à cidade. Após um período de afastamento, Mister Fields sacudiu o pó ao seu fato de mestre de cerimónias e reuniu a sua trupe de palhaços e trapezistas, freaks e outras criaturas meio homem, meio sonho, todas amestradas ao som da caneta. Mas não se pense que estas figuras são prisioneiras num mundo de papel: ao sair desta exposição, o visitante arrisca-se a cruzar-se com elas, e não tardará a perceber que é ele próprio uma personagem tão grotesca, ambígua ou brincalhona quanto as que povoam o teatro místico em que todos vivemos" (informação da organização). O studioteambox fica na LXFactory, edif G, sala 6.A (Lisboa).
Sábado, 14 de Fevereiro de 2015
O título do volume 4 da
História Contemporânea de Portugal - 1808-2010, dirigido por António Costa Pinto e Nuno Gonçalo Monteiro, é muito interessante:
Olhando para Dentro, 1930-1960. O volume tem coordenação de José Luís Cardoso e contém capítulos assinados por José Luís Cardoso ("As chaves do período"; "O processo económico"), Bruno C. Reis ("A vida política"), Pedro Aires Oliveira ("Portugal no mundo"), Álvaro Garrido ("População e sociedade") e Daniel Melo ("A cultura").
O texto que mais interesse me despertou seria o de Daniel Melo pelo tema, com 33 páginas. Destaco os subtítulos: "Introdução: discursos e instituições oficiais de enquadramento"; "Literatura, imprensa e leitura"; "Artes plásticas e arquitectura"; "Teatro e cinema"; "Música e dança"; "Rádio e televisão"; "Mostrar Portugal a si mesmo e aos outros"; "Tertúlias, cafés e tabernas"; "Festas, desporto e lazeres vários"; "Universos socioculturais alternativos"; "Educação". Daniel Melo identifica autores, obras, acontecimentos, interliga grupos e correntes, tudo com uma escrita leve e muito atraente. Da minha leitura, o subtítulo sobre a rádio e a televisão é menos importante, talvez porque eu tenha trabalhado esses tópicos e não há surpresas, mas os últimos subtítulos fornecem informação e, acima de tudo, mostram uma riqueza de propostas e realizações de trabalho cultural mesmo sob a tutela de um regime político opressor e conservador.
Leitura: José Luís Cardoso (coord.) (2014).
Olhando para Dentro, 1930-1960. In António Costa Pinto e Nuno Gonçalo Monteiro (dir.)
História Contemporânea de Portugal - 1808-2010, 4º volume. Madrid e Lisboa: Mapfre e Penguin Random House, 252 páginas, 17,5 euros
Terça-feira, 3 de Fevereiro de 2015
Quando viajamos de avião, temos um olhar diferente sobre a natureza e o edificado pelo homem. O ângulo é essencial. Benjamin Grant, também inspirado pelas descrições e imagens dos astronautas sobre o impacto do desenvolvimento humano na Terra, criou, a partir do Google Earth, imagens impressionantes de satélite no sítio
http://www.overv.eu/, que se aproxima muito da pintura abstracta (ou esta daquela, não importa) [imagens do sector industrial de Tokai, Aichi, Japão, e campos de tulipas, Lisse, Holanda].
Quarta-feira, 28 de Janeiro de 2015
Trinta anos após a morte de Pablo Serrano, um dos mais notáveis escultores espanhóis contemporâneos, a Fundação D. Luís I (Cascais) apresenta
Pablo Serrano – Obras em Papel: uma exposição construída com recurso a uma selecção de obras do acervo de José Luís Rueda, presidente da Fundação Gerardo Rueda, proprietário e director da galeria com o mesmo nome e do da filha do artista. O principal objectivo desta mostra é revelar a relação que o escultor mantinha com o desenho antes da materialização das suas obras. Curadoria da historiadora de arte Consuelo Císcar, ex-diretora do IVAM (Institut Valencià d'Art Modern). De 1 de Fevereiro a 29 de Março de 2015 no Centro Cultural de Cascais (informação da organização da exposição).
Terça-feira, 13 de Janeiro de 2015
Eu nunca pensaria juntar Paula Rego e Rafael Bordalo Pinheiro, como a exposição
Paródias (curadoria de Catarina Alfaro), mas essa relação permite compreender melhor os valores, as formas e as mensagens da obra da pintora radicada em Londres. Ela funciona como a hospedeira da obra de Bordalo Pinheiro, a lente pela qual o olhamos. As inquietações políticas em Paula Rego são mais subtis que as de Rafael Bordalo Pinheiro, os quadros daquele de índole mais cultural e universal, as obras deste de carácter mais temporal e local sobre o quotidiano político. A alegoria, a metáfora e a alusão visual nela corresponde ao comentário escrito nele. Mas permanece o mesmo mundo antropomórfico, um reino animal de gestos e comportamentos próprios, a referência permanente à ópera, como
Aida,
Rigoletto e
La Traviata (Rafael Bordalo Pinheiro passara pelo teatro como actor e figurinista). Isso quer dizer que o retrato e a caricatura são representações - como no teatro - indo da sátira à comédia e à tragédia.
Quarta-feira, 24 de Dezembro de 2014
Anteontem, dia 22 de Dezembro, o jornal
Público editou uma entrevista com Charles Esche, director do Van Abbemuseum (Eindhoven, Holanda, com quadros de Picasso, Chagall, Kandinsky, El Lissitzky, Theo van Doesburg e Mondriaan, entre outros).
Depois de criticar o Estado actual ("Ao fracasso do Estado em se adaptar a contextos e necessidades em mutação, ao fracasso do modelo do Estado providência, dos serviços nacionais de saúde, da ideia de que a cidadania é partilhada pelas pessoas e que, portanto, todas têm certos direitos, a própria ideia dos direitos que derivam de uma cidadania e dos deveres que lhe estão associados"), entra na definição do papel de agente de reinvenção do Estado ("Um dos conceitos para que me parece que devemos olhar com atenção é o dos
commons, um conjunto de valores ou de bens que não têm um proprietário individual, mas colectivo. O Estado manteve para si durante muito tempo a ideia de
commons, agora parece-me que há oportunidade de generalizar a ideia de propriedade colectiva. E parece-me que as próprias instituições artísticas incorporam já em si o conceito de
common. As colecções dos museus, por exemplo: de certa forma, são já propriedade partilhada").
Mais à frente, responde à entrevista dada a Vanessa Rato que a arte, além de experimental, "deve também implicar-se em termos de organização social. De novo: é qualquer coisa que os puristas, os modernistas, vão rejeitar, mas se virmos a arte como tendo uma função, uma delas tem que ser imaginar qualquer coisa que ainda não existe. Isto é necessário e verdade em qualquer processo criativo, quer seja socialmente criativo, individualmente criativo ou mesmo criativo em termos capitalistas, de criação de um novo produto: o processo de imaginar o que ainda não existe é fundamental – se não conseguimos imaginar, será muito difícil criar". E conclui o seu pensamento com a seguinte posição: "A arte pela arte existiu dentro de uma estrutura socio-politico-económica específica, um contexto de excesso produzido pela burguesia, que achava que a arte não devia ter uma função porque a sociedade era rica ao ponto de poder conceber um fora do utilitarismo. Nessa sociedade, a arte recebeu um papel específico, um papel que, à sua maneira, também era político. E no período da Guerra Fria essa arte pela arte foi instrumental, servia para provar a liberdade do mundo ocidental por oposição à instrumentalização que o leste fazia da arte e dos artistas. [...] No museu usamos a expressão espanhola “arte útil”. A ideia da arte como ferramenta [porque, em castelhano, “útil” quer também dizer ferramenta] parece-me mais sedutora do que a ideia de uma arte utilitária. Creio que transmite bem a capacidade da arte em assumir um papel funcional dentro das estruturas de pensamento. E isto implicará determinadas características: uma arte útil terá uma relação real com o mundo, não será apenas simbólica, não usará apenas uma linguagem simbólica, mas fará propostas reais para mudanças reais do mundo real, satisfará talvez uma necessidade ou produzirá um resultado com efeitos fora das instituições da arte". Aqui, identificaria John Ruskin e William Morris como autores ou artistas que resistiram à industrialização, a partir do qual se pode trabalhar um "conceito como o de
arte útil [que] recorda que a arte pode ter uma função genuína na sociedade".A ler na íntegra
aqui.
Segunda-feira, 8 de Dezembro de 2014
O Público traz hoje uma entrevista importante feita por Vanessa Rato a Martha Rosler. Para esta, o papel do artista no século XXI é o de resistente, pelo menos é o que sobressai do título. Estou de acordo com Rosler quando ela tece comentários muito críticos a Richard Florida. O conceito de cidade ou bairro criativo tem fragilidades. Hoje sabe-se que a transferência do conceito de indústria cultural para indústria criativa foi um braço de ferro ganho pela economia sobre a arte e a cultura.
Porém, já não compreendo o que Rosler diz sobre Pollock e a arte abstracta versus realismo: Para ela, os públicos burgueses de finais do século XIX fugiram ao realismo e apoiaram os abstraccionismos. E Pollock estaria a destronar Picasso como artista mais importante, assegura Rosler. Talvez não tenha lido bem a entrevista, mas Pollock estaria assim tão livre do dinheiro como Rosler diz? Ou, pegando num artista pop como Andy Warhol, qual a relação do artista com a economia? Ele é mais livre do que Miguel Ângelo a cumprir o contrato de trabalho na Capela Sistina? Parece-me que a entrevistada é demasiado polémica e não vê a verdade toda. A arte abstracta corresponde a um momento alto da economia norte-americana, que necessita de ter passado e glória antiga. A abstracção trouxe esse consolo.
Na sua página da internet, Martha Rosler diz que trabalha em vídeo, fotografia, texto, instalação e performance.