Segunda-feira, 31 de Maio de 2004

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AS NOTÍCIAS EM MAIO DE 1974 - I

As notícias publicadas durante Maio de 1974 – há 30 anos – por um conjunto de seis jornais lisboetas (Diário de Notícias, O Século, Diário Popular, Diário de Lisboa, A Capital e República) foram a base do livro Maio’74 dia-a-dia, publicado em 2001 pela editora Teorema e pela associação cultural Abril em Maio - os créditos dos autores surgirão na última mensagem desta série. O texto aqui presente foi o resultado da minha leitura desse livro, que fiz em 20 de Maio de 2001 naquela associação e, mais tarde, editado na revista JJ – Jornalismo e Jornalistas, nº 10, Abril-Junho de 2002.

O que aqui se mostra vale pela análise de uma época de grande transformação e profunda controvérsia social e política, de que os jornais são fiéis depositários. A sensação que tenho ao revisitar situações e simples vocábulos de há 30 anos lembra-me a leitura de jornais ainda mais antigos, mormente os das décadas de 1920 e 1930, que estudei afincadamente. A História não se pode debruçar apenas nos factos e nas interpretações que são feitas na época, mas também estudar em profundidade a linguagem dos textos. As imagens de jornais que acompanham o texto, apesar de escassas, servem para contextualizar o período.

Como a obra que sigo não existia sob a forma de história com enredo e personagens principais, tive de entrelaçar episódios onde convivem agentes sociais de nome impresso (políticos e artistas, que demarcam territórios políticos, sociais e culturais), e agentes sociais anónimos (autores de comunicados, cartas dos leitores e palavras de ordem, vozes populares cujos movimentos expressam vontades recalcadas ao longo do tempo e que explodem em simultâneo), formando pequenas histórias inteligíveis.

Três questões prévias

Primeiro, o livro não refere directamente os títulos, leads e fontes de informação nas notícias, mas as ideias, movimentos e frases-chave. É um registo de centenas de factos e de discursos, desconstruídos como se fizéssemos uma leitura diária, a que falta o enquadramento experiencial e de fundo. Cada acontecimento noticiado não parece ter articulação com os enunciados acima, abaixo, antes ou depois escritos, no espaço e no tempo. Não podemos comparar tamanhos, ver as secções dos jornais, perceber a contaminação dos textos próximos aos analisados. De qualquer maneira, qualquer mérito da leitura é totalmente devedor do livro sobre o qual escrevemos.

Segundo, as notícias giram em torno de acontecimentos, mas, com frequência,foto.jpg também anunciam intenções, projectos ou expectativas, mobilizáveis pelos agentes sociais. No período em análise, verificamos que os jornais se constituíram em enormes recipientes de comunicados e de outras estratégias de comunicação produzidas por diversificados promotores de factos, numa afirmação de significados. Em 1974, como hoje, cada agente social via os meios noticiosos como alvos privilegiados para passar mensagens. Embora verifiquemos grandes mudanças estruturais no decurso de um mês, não nos foi possível concluir se os jornais formaram a opinião pública, com a criação de uma agenda jornalística específica, ou se foram simples transmissores de factos e opiniões [imagem da revista JJ - Jornalismo e Jornalistas, onde publiquei o texto].

Terceiro, do livro preferimos estudar mais as páginas do lado direito – palavras, declarações orais, comunicados escritos – do que as páginas dos factos. Optamos pelo domínio do dizível, que se aproxima dos valores criados ou anunciados, do fabuloso, do imaginário, de um mundo sem barreiras. Maio de 1974, na apreciação às notícias editadas, foi um período de imensa utopia. Para trabalhar a informação incluída no livro seria preciso estender a duração do objecto de análise a mais meses de recolha de notícias e alargar a discussão a mais pessoas, para obter uma perspectiva científica das estruturas sociais e mentais. Contudo, pela amostra do mês recolhido, detectam-se a errância, a contradição, a rapidez e a dinâmica, a ultrapassagem de uns acontecimentos e agentes sociais pelos outros, nas opiniões e nas opções políticas delineadas, próprias de um momento crucial na vida do país. Por um lado, foi um tempo de ruptura com normas sociais e linguagens. Por outro lado, as movimentações e reivindicações sociais e políticas, apesar da grande produção factual e discursiva proveniente de Lisboa, espalharam-se pelo país.

A partir da leitura atenta do livro, incidimos o interesse, nomeadamente, nos valores-notícia, nas histórias de continuidade, em alguns personagens ou situações. Deixamos de fora, por exemplo, os enunciados sobre a situação política internacional, das colónias e dos partidos.

Palavras

A nossa análise começou no uso de novos vocábulos, que adquiriam um lugar importante na comunicação quotidiana. Em polarização simples e dicotómica definem-se fascistas e democratas – “democratas de Portalegre denunciam reuniões de fascistas notórios na cidade”, “grupo de fascistas interrompe uma marcha que atravessava Murça, vinda de um comício de Mirandela, e apedreja carros de democratas”, “sessão promovida por democratas em Cinfães”, trabalhadores do Benfica em protesto “contra fascista na direcção”. Trata-se de quadro facilitador para uma melhor compreensão pedagógica do tempo revolucionário. No campo jornalístico não se detectam intervenientes com interesses múltiplos, contraditórios, fazendo o jogo de outras forças ou procurando hegemonizar uma situação.

O medo de muitos levou-os a fugir do país, nomeadamente os identificados como pertencentes ao governo e às forças repressivas do anterior regime, ao mesmo tempo que se proclamava a necessidade da tomada de medidas económicas e financeiras estruturais. A fuga de dinheiro ou objectos foi notícia. De uma vez, foram apreendidos 13700 contos no aeroporto; de outra vez, um passageiro era detido no aeroporto com 7000 contos. Um responsável militar assegurava estar “controlada a saída de pessoas com capacidade financeira”, mas os bancários mantinham piquetes no BPA para evitar saídas de valores. O sindicato dos ourives pedia o controlo do fabrico e da venda de ouro e jóias. Os economistas defendiam a nacionalização da banca, enquanto a actividade da bolsa de valores era suspensa, informando-se, depois, a sua eminente reabertura. A nacionalização da banca e de outros sectores de actividade concretizou-se em 1975, marcando a agenda pública por longos anos.align="right">

Da leitura do livro, extraímos algumas expressões significativas da linguagem e da acção: quadros superiores da Soda Póvoa “não toleram infiltrações no seu seio de aventureiros, oportunistas e provocadores”, “provocadores ligados ao fascismo a infiltrarem-se na universidade”, “provocadores actuam na Faculdade de Letras do Porto”, “panfleto apelando à destruição de equipamentos fabris era de provocador ligado à antiga Legião”, “estão a ser elaboradas listas de bufos assalariados”, “o perigo da contra-revolução”, “Maria José Mauperrin reintegrada na EN”, “representantes dos TLP: saneamento a todos os níveis”, “destituição de fantoche”, “2000 trabalhadores da Timex continuam em greve até saírem seis indesejáveis”, os “realizadores-produtores apresentam um programa divisionista”, suspensão da greve na Renault “para evitar confusões com capitalistas e reaccionários que minam o actual movimento grevista”, saneamento de elementos da direcção e do corpo docente da Escola Superior de Meios de Comunicação Social.

Empregam-se termos como apoios, demissões, comissões provisórias. Registam-se simples mudanças de nomes, como o de grémio por associação. As alterações atingem a toponímica: Alpiarça, Guarda, Coimbra. Escritores arrancaram a placa da rua Agostinho Lourenço e substituiram-na por Soeiro Pereira Gomes, confundindo o nome de elemento da Pide com o de um químico do séc. XIX. A Junta de Salvação Nacional (JSN) aceitou o comunicado aprovado em reunião dos trabalhadores da TAP, para eleição de representantes na administração, mas com a alteração da palavra “exigem” por “requerem”.

[continua]
publicado por industrias-culturais às 08:23
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AS NOTÍCIAS EM MAIO DE 1974 - I

As notícias publicadas durante Maio de 1974 – há 30 anos – por um conjunto de seis jornais lisboetas (Diário de Notícias, O Século, Diário Popular, Diário de Lisboa, A Capital e República) foram a base do livro Maio’74 dia-a-dia, publicado em 2001 pela editora Teorema e pela associação cultural Abril em Maio - os créditos dos autores surgirão na última mensagem desta série. O texto aqui presente foi o resultado da minha leitura desse livro, que fiz em 20 de Maio de 2001 naquela associação e, mais tarde, editado na revista JJ – Jornalismo e Jornalistas, nº 10, Abril-Junho de 2002.

O que aqui se mostra vale pela análise de uma época de grande transformação e profunda controvérsia social e política, de que os jornais são fiéis depositários. A sensação que tenho ao revisitar situações e simples vocábulos de há 30 anos lembra-me a leitura de jornais ainda mais antigos, mormente os das décadas de 1920 e 1930, que estudei afincadamente. A História não se pode debruçar apenas nos factos e nas interpretações que são feitas na época, mas também estudar em profundidade a linguagem dos textos. As imagens de jornais que acompanham o texto, apesar de escassas, servem para contextualizar o período.

Como a obra que sigo não existia sob a forma de história com enredo e personagens principais, tive de entrelaçar episódios onde convivem agentes sociais de nome impresso (políticos e artistas, que demarcam territórios políticos, sociais e culturais), e agentes sociais anónimos (autores de comunicados, cartas dos leitores e palavras de ordem, vozes populares cujos movimentos expressam vontades recalcadas ao longo do tempo e que explodem em simultâneo), formando pequenas histórias inteligíveis.

Três questões prévias

Primeiro, o livro não refere directamente os títulos, leads e fontes de informação nas notícias, mas as ideias, movimentos e frases-chave. É um registo de centenas de factos e de discursos, desconstruídos como se fizéssemos uma leitura diária, a que falta o enquadramento experiencial e de fundo. Cada acontecimento noticiado não parece ter articulação com os enunciados acima, abaixo, antes ou depois escritos, no espaço e no tempo. Não podemos comparar tamanhos, ver as secções dos jornais, perceber a contaminação dos textos próximos aos analisados. De qualquer maneira, qualquer mérito da leitura é totalmente devedor do livro sobre o qual escrevemos.

Segundo, as notícias giram em torno de acontecimentos, mas, com frequência,foto.jpg também anunciam intenções, projectos ou expectativas, mobilizáveis pelos agentes sociais. No período em análise, verificamos que os jornais se constituíram em enormes recipientes de comunicados e de outras estratégias de comunicação produzidas por diversificados promotores de factos, numa afirmação de significados. Em 1974, como hoje, cada agente social via os meios noticiosos como alvos privilegiados para passar mensagens. Embora verifiquemos grandes mudanças estruturais no decurso de um mês, não nos foi possível concluir se os jornais formaram a opinião pública, com a criação de uma agenda jornalística específica, ou se foram simples transmissores de factos e opiniões [imagem da revista JJ - Jornalismo e Jornalistas, onde publiquei o texto].

Terceiro, do livro preferimos estudar mais as páginas do lado direito – palavras, declarações orais, comunicados escritos – do que as páginas dos factos. Optamos pelo domínio do dizível, que se aproxima dos valores criados ou anunciados, do fabuloso, do imaginário, de um mundo sem barreiras. Maio de 1974, na apreciação às notícias editadas, foi um período de imensa utopia. Para trabalhar a informação incluída no livro seria preciso estender a duração do objecto de análise a mais meses de recolha de notícias e alargar a discussão a mais pessoas, para obter uma perspectiva científica das estruturas sociais e mentais. Contudo, pela amostra do mês recolhido, detectam-se a errância, a contradição, a rapidez e a dinâmica, a ultrapassagem de uns acontecimentos e agentes sociais pelos outros, nas opiniões e nas opções políticas delineadas, próprias de um momento crucial na vida do país. Por um lado, foi um tempo de ruptura com normas sociais e linguagens. Por outro lado, as movimentações e reivindicações sociais e políticas, apesar da grande produção factual e discursiva proveniente de Lisboa, espalharam-se pelo país.

A partir da leitura atenta do livro, incidimos o interesse, nomeadamente, nos valores-notícia, nas histórias de continuidade, em alguns personagens ou situações. Deixamos de fora, por exemplo, os enunciados sobre a situação política internacional, das colónias e dos partidos.

Palavras

A nossa análise começou no uso de novos vocábulos, que adquiriam um lugar importante na comunicação quotidiana. Em polarização simples e dicotómica definem-se fascistas e democratas – “democratas de Portalegre denunciam reuniões de fascistas notórios na cidade”, “grupo de fascistas interrompe uma marcha que atravessava Murça, vinda de um comício de Mirandela, e apedreja carros de democratas”, “sessão promovida por democratas em Cinfães”, trabalhadores do Benfica em protesto “contra fascista na direcção”. Trata-se de quadro facilitador para uma melhor compreensão pedagógica do tempo revolucionário. No campo jornalístico não se detectam intervenientes com interesses múltiplos, contraditórios, fazendo o jogo de outras forças ou procurando hegemonizar uma situação.

O medo de muitos levou-os a fugir do país, nomeadamente os identificados como pertencentes ao governo e às forças repressivas do anterior regime, ao mesmo tempo que se proclamava a necessidade da tomada de medidas económicas e financeiras estruturais. A fuga de dinheiro ou objectos foi notícia. De uma vez, foram apreendidos 13700 contos no aeroporto; de outra vez, um passageiro era detido no aeroporto com 7000 contos. Um responsável militar assegurava estar “controlada a saída de pessoas com capacidade financeira”, mas os bancários mantinham piquetes no BPA para evitar saídas de valores. O sindicato dos ourives pedia o controlo do fabrico e da venda de ouro e jóias. Os economistas defendiam a nacionalização da banca, enquanto a actividade da bolsa de valores era suspensa, informando-se, depois, a sua eminente reabertura. A nacionalização da banca e de outros sectores de actividade concretizou-se em 1975, marcando a agenda pública por longos anos.align="right">

Da leitura do livro, extraímos algumas expressões significativas da linguagem e da acção: quadros superiores da Soda Póvoa “não toleram infiltrações no seu seio de aventureiros, oportunistas e provocadores”, “provocadores ligados ao fascismo a infiltrarem-se na universidade”, “provocadores actuam na Faculdade de Letras do Porto”, “panfleto apelando à destruição de equipamentos fabris era de provocador ligado à antiga Legião”, “estão a ser elaboradas listas de bufos assalariados”, “o perigo da contra-revolução”, “Maria José Mauperrin reintegrada na EN”, “representantes dos TLP: saneamento a todos os níveis”, “destituição de fantoche”, “2000 trabalhadores da Timex continuam em greve até saírem seis indesejáveis”, os “realizadores-produtores apresentam um programa divisionista”, suspensão da greve na Renault “para evitar confusões com capitalistas e reaccionários que minam o actual movimento grevista”, saneamento de elementos da direcção e do corpo docente da Escola Superior de Meios de Comunicação Social.

Empregam-se termos como apoios, demissões, comissões provisórias. Registam-se simples mudanças de nomes, como o de grémio por associação. As alterações atingem a toponímica: Alpiarça, Guarda, Coimbra. Escritores arrancaram a placa da rua Agostinho Lourenço e substituiram-na por Soeiro Pereira Gomes, confundindo o nome de elemento da Pide com o de um químico do séc. XIX. A Junta de Salvação Nacional (JSN) aceitou o comunicado aprovado em reunião dos trabalhadores da TAP, para eleição de representantes na administração, mas com a alteração da palavra “exigem” por “requerem”.

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As notícias publicadas durante Maio de 1974 – há 30 anos – por um conjunto de seis jornais lisboetas (Diário de Notícias, O Século, Diário Popular, Diário de Lisboa, A Capital e República) foram a base do livro Maio’74 dia-a-dia, publicado em 2001 pela editora Teorema e pela associação cultural Abril em Maio - os créditos dos autores surgirão na última mensagem desta série. O texto aqui presente foi o resultado da minha leitura desse livro, que fiz em 20 de Maio de 2001 naquela associação e, mais tarde, editado na revista JJ – Jornalismo e Jornalistas, nº 10, Abril-Junho de 2002.

O que aqui se mostra vale pela análise de uma época de grande transformação e profunda controvérsia social e política, de que os jornais são fiéis depositários. A sensação que tenho ao revisitar situações e simples vocábulos de há 30 anos lembra-me a leitura de jornais ainda mais antigos, mormente os das décadas de 1920 e 1930, que estudei afincadamente. A História não se pode debruçar apenas nos factos e nas interpretações que são feitas na época, mas também estudar em profundidade a linguagem dos textos. As imagens de jornais que acompanham o texto, apesar de escassas, servem para contextualizar o período.

Como a obra que sigo não existia sob a forma de história com enredo e personagens principais, tive de entrelaçar episódios onde convivem agentes sociais de nome impresso (políticos e artistas, que demarcam territórios políticos, sociais e culturais), e agentes sociais anónimos (autores de comunicados, cartas dos leitores e palavras de ordem, vozes populares cujos movimentos expressam vontades recalcadas ao longo do tempo e que explodem em simultâneo), formando pequenas histórias inteligíveis.

Três questões prévias

Primeiro, o livro não refere directamente os títulos, leads e fontes de informação nas notícias, mas as ideias, movimentos e frases-chave. É um registo de centenas de factos e de discursos, desconstruídos como se fizéssemos uma leitura diária, a que falta o enquadramento experiencial e de fundo. Cada acontecimento noticiado não parece ter articulação com os enunciados acima, abaixo, antes ou depois escritos, no espaço e no tempo. Não podemos comparar tamanhos, ver as secções dos jornais, perceber a contaminação dos textos próximos aos analisados. De qualquer maneira, qualquer mérito da leitura é totalmente devedor do livro sobre o qual escrevemos.

Segundo, as notícias giram em torno de acontecimentos, mas, com frequência,foto.jpg também anunciam intenções, projectos ou expectativas, mobilizáveis pelos agentes sociais. No período em análise, verificamos que os jornais se constituíram em enormes recipientes de comunicados e de outras estratégias de comunicação produzidas por diversificados promotores de factos, numa afirmação de significados. Em 1974, como hoje, cada agente social via os meios noticiosos como alvos privilegiados para passar mensagens. Embora verifiquemos grandes mudanças estruturais no decurso de um mês, não nos foi possível concluir se os jornais formaram a opinião pública, com a criação de uma agenda jornalística específica, ou se foram simples transmissores de factos e opiniões [imagem da revista JJ - Jornalismo e Jornalistas, onde publiquei o texto].

Terceiro, do livro preferimos estudar mais as páginas do lado direito – palavras, declarações orais, comunicados escritos – do que as páginas dos factos. Optamos pelo domínio do dizível, que se aproxima dos valores criados ou anunciados, do fabuloso, do imaginário, de um mundo sem barreiras. Maio de 1974, na apreciação às notícias editadas, foi um período de imensa utopia. Para trabalhar a informação incluída no livro seria preciso estender a duração do objecto de análise a mais meses de recolha de notícias e alargar a discussão a mais pessoas, para obter uma perspectiva científica das estruturas sociais e mentais. Contudo, pela amostra do mês recolhido, detectam-se a errância, a contradição, a rapidez e a dinâmica, a ultrapassagem de uns acontecimentos e agentes sociais pelos outros, nas opiniões e nas opções políticas delineadas, próprias de um momento crucial na vida do país. Por um lado, foi um tempo de ruptura com normas sociais e linguagens. Por outro lado, as movimentações e reivindicações sociais e políticas, apesar da grande produção factual e discursiva proveniente de Lisboa, espalharam-se pelo país.

A partir da leitura atenta do livro, incidimos o interesse, nomeadamente, nos valores-notícia, nas histórias de continuidade, em alguns personagens ou situações. Deixamos de fora, por exemplo, os enunciados sobre a situação política internacional, das colónias e dos partidos.

Palavras

A nossa análise começou no uso de novos vocábulos, que adquiriam um lugar importante na comunicação quotidiana. Em polarização simples e dicotómica definem-se fascistas e democratas – “democratas de Portalegre denunciam reuniões de fascistas notórios na cidade”, “grupo de fascistas interrompe uma marcha que atravessava Murça, vinda de um comício de Mirandela, e apedreja carros de democratas”, “sessão promovida por democratas em Cinfães”, trabalhadores do Benfica em protesto “contra fascista na direcção”. Trata-se de quadro facilitador para uma melhor compreensão pedagógica do tempo revolucionário. No campo jornalístico não se detectam intervenientes com interesses múltiplos, contraditórios, fazendo o jogo de outras forças ou procurando hegemonizar uma situação.

O medo de muitos levou-os a fugir do país, nomeadamente os identificados como pertencentes ao governo e às forças repressivas do anterior regime, ao mesmo tempo que se proclamava a necessidade da tomada de medidas económicas e financeiras estruturais. A fuga de dinheiro ou objectos foi notícia. De uma vez, foram apreendidos 13700 contos no aeroporto; de outra vez, um passageiro era detido no aeroporto com 7000 contos. Um responsável militar assegurava estar “controlada a saída de pessoas com capacidade financeira”, mas os bancários mantinham piquetes no BPA para evitar saídas de valores. O sindicato dos ourives pedia o controlo do fabrico e da venda de ouro e jóias. Os economistas defendiam a nacionalização da banca, enquanto a actividade da bolsa de valores era suspensa, informando-se, depois, a sua eminente reabertura. A nacionalização da banca e de outros sectores de actividade concretizou-se em 1975, marcando a agenda pública por longos anos.align="right">

Da leitura do livro, extraímos algumas expressões significativas da linguagem e da acção: quadros superiores da Soda Póvoa “não toleram infiltrações no seu seio de aventureiros, oportunistas e provocadores”, “provocadores ligados ao fascismo a infiltrarem-se na universidade”, “provocadores actuam na Faculdade de Letras do Porto”, “panfleto apelando à destruição de equipamentos fabris era de provocador ligado à antiga Legião”, “estão a ser elaboradas listas de bufos assalariados”, “o perigo da contra-revolução”, “Maria José Mauperrin reintegrada na EN”, “representantes dos TLP: saneamento a todos os níveis”, “destituição de fantoche”, “2000 trabalhadores da Timex continuam em greve até saírem seis indesejáveis”, os “realizadores-produtores apresentam um programa divisionista”, suspensão da greve na Renault “para evitar confusões com capitalistas e reaccionários que minam o actual movimento grevista”, saneamento de elementos da direcção e do corpo docente da Escola Superior de Meios de Comunicação Social.

Empregam-se termos como apoios, demissões, comissões provisórias. Registam-se simples mudanças de nomes, como o de grémio por associação. As alterações atingem a toponímica: Alpiarça, Guarda, Coimbra. Escritores arrancaram a placa da rua Agostinho Lourenço e substituiram-na por Soeiro Pereira Gomes, confundindo o nome de elemento da Pide com o de um químico do séc. XIX. A Junta de Salvação Nacional (JSN) aceitou o comunicado aprovado em reunião dos trabalhadores da TAP, para eleição de representantes na administração, mas com a alteração da palavra “exigem” por “requerem”.

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As notícias publicadas durante Maio de 1974 – há 30 anos – por um conjunto de seis jornais lisboetas (Diário de Notícias, O Século, Diário Popular, Diário de Lisboa, A Capital e República) foram a base do livro Maio’74 dia-a-dia, publicado em 2001 pela editora Teorema e pela associação cultural Abril em Maio - os créditos dos autores surgirão na última mensagem desta série. O texto aqui presente foi o resultado da minha leitura desse livro, que fiz em 20 de Maio de 2001 naquela associação e, mais tarde, editado na revista JJ – Jornalismo e Jornalistas, nº 10, Abril-Junho de 2002.

O que aqui se mostra vale pela análise de uma época de grande transformação e profunda controvérsia social e política, de que os jornais são fiéis depositários. A sensação que tenho ao revisitar situações e simples vocábulos de há 30 anos lembra-me a leitura de jornais ainda mais antigos, mormente os das décadas de 1920 e 1930, que estudei afincadamente. A História não se pode debruçar apenas nos factos e nas interpretações que são feitas na época, mas também estudar em profundidade a linguagem dos textos. As imagens de jornais que acompanham o texto, apesar de escassas, servem para contextualizar o período.

Como a obra que sigo não existia sob a forma de história com enredo e personagens principais, tive de entrelaçar episódios onde convivem agentes sociais de nome impresso (políticos e artistas, que demarcam territórios políticos, sociais e culturais), e agentes sociais anónimos (autores de comunicados, cartas dos leitores e palavras de ordem, vozes populares cujos movimentos expressam vontades recalcadas ao longo do tempo e que explodem em simultâneo), formando pequenas histórias inteligíveis.

Três questões prévias

Primeiro, o livro não refere directamente os títulos, leads e fontes de informação nas notícias, mas as ideias, movimentos e frases-chave. É um registo de centenas de factos e de discursos, desconstruídos como se fizéssemos uma leitura diária, a que falta o enquadramento experiencial e de fundo. Cada acontecimento noticiado não parece ter articulação com os enunciados acima, abaixo, antes ou depois escritos, no espaço e no tempo. Não podemos comparar tamanhos, ver as secções dos jornais, perceber a contaminação dos textos próximos aos analisados. De qualquer maneira, qualquer mérito da leitura é totalmente devedor do livro sobre o qual escrevemos.

Segundo, as notícias giram em torno de acontecimentos, mas, com frequência,foto.jpg também anunciam intenções, projectos ou expectativas, mobilizáveis pelos agentes sociais. No período em análise, verificamos que os jornais se constituíram em enormes recipientes de comunicados e de outras estratégias de comunicação produzidas por diversificados promotores de factos, numa afirmação de significados. Em 1974, como hoje, cada agente social via os meios noticiosos como alvos privilegiados para passar mensagens. Embora verifiquemos grandes mudanças estruturais no decurso de um mês, não nos foi possível concluir se os jornais formaram a opinião pública, com a criação de uma agenda jornalística específica, ou se foram simples transmissores de factos e opiniões [imagem da revista JJ - Jornalismo e Jornalistas, onde publiquei o texto].

Terceiro, do livro preferimos estudar mais as páginas do lado direito – palavras, declarações orais, comunicados escritos – do que as páginas dos factos. Optamos pelo domínio do dizível, que se aproxima dos valores criados ou anunciados, do fabuloso, do imaginário, de um mundo sem barreiras. Maio de 1974, na apreciação às notícias editadas, foi um período de imensa utopia. Para trabalhar a informação incluída no livro seria preciso estender a duração do objecto de análise a mais meses de recolha de notícias e alargar a discussão a mais pessoas, para obter uma perspectiva científica das estruturas sociais e mentais. Contudo, pela amostra do mês recolhido, detectam-se a errância, a contradição, a rapidez e a dinâmica, a ultrapassagem de uns acontecimentos e agentes sociais pelos outros, nas opiniões e nas opções políticas delineadas, próprias de um momento crucial na vida do país. Por um lado, foi um tempo de ruptura com normas sociais e linguagens. Por outro lado, as movimentações e reivindicações sociais e políticas, apesar da grande produção factual e discursiva proveniente de Lisboa, espalharam-se pelo país.

A partir da leitura atenta do livro, incidimos o interesse, nomeadamente, nos valores-notícia, nas histórias de continuidade, em alguns personagens ou situações. Deixamos de fora, por exemplo, os enunciados sobre a situação política internacional, das colónias e dos partidos.

Palavras

A nossa análise começou no uso de novos vocábulos, que adquiriam um lugar importante na comunicação quotidiana. Em polarização simples e dicotómica definem-se fascistas e democratas – “democratas de Portalegre denunciam reuniões de fascistas notórios na cidade”, “grupo de fascistas interrompe uma marcha que atravessava Murça, vinda de um comício de Mirandela, e apedreja carros de democratas”, “sessão promovida por democratas em Cinfães”, trabalhadores do Benfica em protesto “contra fascista na direcção”. Trata-se de quadro facilitador para uma melhor compreensão pedagógica do tempo revolucionário. No campo jornalístico não se detectam intervenientes com interesses múltiplos, contraditórios, fazendo o jogo de outras forças ou procurando hegemonizar uma situação.

O medo de muitos levou-os a fugir do país, nomeadamente os identificados como pertencentes ao governo e às forças repressivas do anterior regime, ao mesmo tempo que se proclamava a necessidade da tomada de medidas económicas e financeiras estruturais. A fuga de dinheiro ou objectos foi notícia. De uma vez, foram apreendidos 13700 contos no aeroporto; de outra vez, um passageiro era detido no aeroporto com 7000 contos. Um responsável militar assegurava estar “controlada a saída de pessoas com capacidade financeira”, mas os bancários mantinham piquetes no BPA para evitar saídas de valores. O sindicato dos ourives pedia o controlo do fabrico e da venda de ouro e jóias. Os economistas defendiam a nacionalização da banca, enquanto a actividade da bolsa de valores era suspensa, informando-se, depois, a sua eminente reabertura. A nacionalização da banca e de outros sectores de actividade concretizou-se em 1975, marcando a agenda pública por longos anos.align="right">

Da leitura do livro, extraímos algumas expressões significativas da linguagem e da acção: quadros superiores da Soda Póvoa “não toleram infiltrações no seu seio de aventureiros, oportunistas e provocadores”, “provocadores ligados ao fascismo a infiltrarem-se na universidade”, “provocadores actuam na Faculdade de Letras do Porto”, “panfleto apelando à destruição de equipamentos fabris era de provocador ligado à antiga Legião”, “estão a ser elaboradas listas de bufos assalariados”, “o perigo da contra-revolução”, “Maria José Mauperrin reintegrada na EN”, “representantes dos TLP: saneamento a todos os níveis”, “destituição de fantoche”, “2000 trabalhadores da Timex continuam em greve até saírem seis indesejáveis”, os “realizadores-produtores apresentam um programa divisionista”, suspensão da greve na Renault “para evitar confusões com capitalistas e reaccionários que minam o actual movimento grevista”, saneamento de elementos da direcção e do corpo docente da Escola Superior de Meios de Comunicação Social.

Empregam-se termos como apoios, demissões, comissões provisórias. Registam-se simples mudanças de nomes, como o de grémio por associação. As alterações atingem a toponímica: Alpiarça, Guarda, Coimbra. Escritores arrancaram a placa da rua Agostinho Lourenço e substituiram-na por Soeiro Pereira Gomes, confundindo o nome de elemento da Pide com o de um químico do séc. XIX. A Junta de Salvação Nacional (JSN) aceitou o comunicado aprovado em reunião dos trabalhadores da TAP, para eleição de representantes na administração, mas com a alteração da palavra “exigem” por “requerem”.

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AS NOTÍCIAS EM MAIO DE 1974 - I

As notícias publicadas durante Maio de 1974 – há 30 anos – por um conjunto de seis jornais lisboetas (Diário de Notícias, O Século, Diário Popular, Diário de Lisboa, A Capital e República) foram a base do livro Maio’74 dia-a-dia, publicado em 2001 pela editora Teorema e pela associação cultural Abril em Maio - os créditos dos autores surgirão na última mensagem desta série. O texto aqui presente foi o resultado da minha leitura desse livro, que fiz em 20 de Maio de 2001 naquela associação e, mais tarde, editado na revista JJ – Jornalismo e Jornalistas, nº 10, Abril-Junho de 2002.


O que aqui se mostra vale pela análise de uma época de grande transformação e profunda controvérsia social e política, de que os jornais são fiéis depositários. A sensação que tenho ao revisitar situações e simples vocábulos de há 30 anos lembra-me a leitura de jornais ainda mais antigos, mormente os das décadas de 1920 e 1930, que estudei afincadamente. A História não se pode debruçar apenas nos factos e nas interpretações que são feitas na época, mas também estudar em profundidade a linguagem dos textos. As imagens de jornais que acompanham o texto, apesar de escassas, servem para contextualizar o período.


Como a obra que sigo não existia sob a forma de história com enredo e personagens principais, tive de entrelaçar episódios onde convivem agentes sociais de nome impresso (políticos e artistas, que demarcam territórios políticos, sociais e culturais), e agentes sociais anónimos (autores de comunicados, cartas dos leitores e palavras de ordem, vozes populares cujos movimentos expressam vontades recalcadas ao longo do tempo e que explodem em simultâneo), formando pequenas histórias inteligíveis.


Três questões prévias

Primeiro, o livro não refere directamente os títulos, leads e fontes de informação nas notícias, mas as ideias, movimentos e frases-chave. É um registo de centenas de factos e de discursos, desconstruídos como se fizéssemos uma leitura diária, a que falta o enquadramento experiencial e de fundo. Cada acontecimento noticiado não parece ter articulação com os enunciados acima, abaixo, antes ou depois escritos, no espaço e no tempo. Não podemos comparar tamanhos, ver as secções dos jornais, perceber a contaminação dos textos próximos aos analisados. De qualquer maneira, qualquer mérito da leitura é totalmente devedor do livro sobre o qual escrevemos.


Segundo, as notícias giram em torno de acontecimentos, mas, com frequência,foto.jpg também anunciam intenções, projectos ou expectativas, mobilizáveis pelos agentes sociais. No período em análise, verificamos que os jornais se constituíram em enormes recipientes de comunicados e de outras estratégias de comunicação produzidas por diversificados promotores de factos, numa afirmação de significados. Em 1974, como hoje, cada agente social via os meios noticiosos como alvos privilegiados para passar mensagens. Embora verifiquemos grandes mudanças estruturais no decurso de um mês, não nos foi possível concluir se os jornais formaram a opinião pública, com a criação de uma agenda jornalística específica, ou se foram simples transmissores de factos e opiniões [imagem da revista JJ - Jornalismo e Jornalistas, onde publiquei o texto].


Terceiro, do livro preferimos estudar mais as páginas do lado direito – palavras, declarações orais, comunicados escritos – do que as páginas dos factos. Optamos pelo domínio do dizível, que se aproxima dos valores criados ou anunciados, do fabuloso, do imaginário, de um mundo sem barreiras. Maio de 1974, na apreciação às notícias editadas, foi um período de imensa utopia. Para trabalhar a informação incluída no livro seria preciso estender a duração do objecto de análise a mais meses de recolha de notícias e alargar a discussão a mais pessoas, para obter uma perspectiva científica das estruturas sociais e mentais. Contudo, pela amostra do mês recolhido, detectam-se a errância, a contradição, a rapidez e a dinâmica, a ultrapassagem de uns acontecimentos e agentes sociais pelos outros, nas opiniões e nas opções políticas delineadas, próprias de um momento crucial na vida do país. Por um lado, foi um tempo de ruptura com normas sociais e linguagens. Por outro lado, as movimentações e reivindicações sociais e políticas, apesar da grande produção factual e discursiva proveniente de Lisboa, espalharam-se pelo país.


A partir da leitura atenta do livro, incidimos o interesse, nomeadamente, nos valores-notícia, nas histórias de continuidade, em alguns personagens ou situações. Deixamos de fora, por exemplo, os enunciados sobre a situação política internacional, das colónias e dos partidos.


Palavras

A nossa análise começou no uso de novos vocábulos, que adquiriam um lugar importante na comunicação quotidiana. Em polarização simples e dicotómica definem-se fascistas e democratas – “democratas de Portalegre denunciam reuniões de fascistas notórios na cidade”, “grupo de fascistas interrompe uma marcha que atravessava Murça, vinda de um comício de Mirandela, e apedreja carros de democratas”, “sessão promovida por democratas em Cinfães”, trabalhadores do Benfica em protesto “contra fascista na direcção”. Trata-se de quadro facilitador para uma melhor compreensão pedagógica do tempo revolucionário. No campo jornalístico não se detectam intervenientes com interesses múltiplos, contraditórios, fazendo o jogo de outras forças ou procurando hegemonizar uma situação.


O medo de muitos levou-os a fugir do país, nomeadamente os identificados como pertencentes ao governo e às forças repressivas do anterior regime, ao mesmo tempo que se proclamava a necessidade da tomada de medidas económicas e financeiras estruturais. A fuga de dinheiro ou objectos foi notícia. De uma vez, foram apreendidos 13700 contos no aeroporto; de outra vez, um passageiro era detido no aeroporto com 7000 contos. Um responsável militar assegurava estar “controlada a saída de pessoas com capacidade financeira”, mas os bancários mantinham piquetes no BPA para evitar saídas de valores. O sindicato dos ourives pedia o controlo do fabrico e da venda de ouro e jóias. Os economistas defendiam a nacionalização da banca, enquanto a actividade da bolsa de valores era suspensa, informando-se, depois, a sua eminente reabertura. A nacionalização da banca e de outros sectores de actividade concretizou-se em 1975, marcando a agenda pública por longos anos.align="right">


Da leitura do livro, extraímos algumas expressões significativas da linguagem e da acção: quadros superiores da Soda Póvoa “não toleram infiltrações no seu seio de aventureiros, oportunistas e provocadores”, “provocadores ligados ao fascismo a infiltrarem-se na universidade”, “provocadores actuam na Faculdade de Letras do Porto”, “panfleto apelando à destruição de equipamentos fabris era de provocador ligado à antiga Legião”, “estão a ser elaboradas listas de bufos assalariados”, “o perigo da contra-revolução”, “Maria José Mauperrin reintegrada na EN”, “representantes dos TLP: saneamento a todos os níveis”, “destituição de fantoche”, “2000 trabalhadores da Timex continuam em greve até saírem seis indesejáveis”, os “realizadores-produtores apresentam um programa divisionista”, suspensão da greve na Renault “para evitar confusões com capitalistas e reaccionários que minam o actual movimento grevista”, saneamento de elementos da direcção e do corpo docente da Escola Superior de Meios de Comunicação Social.


Empregam-se termos como apoios, demissões, comissões provisórias. Registam-se simples mudanças de nomes, como o de grémio por associação. As alterações atingem a toponímica: Alpiarça, Guarda, Coimbra. Escritores arrancaram a placa da rua Agostinho Lourenço e substituiram-na por Soeiro Pereira Gomes, confundindo o nome de elemento da Pide com o de um químico do séc. XIX. A Junta de Salvação Nacional (JSN) aceitou o comunicado aprovado em reunião dos trabalhadores da TAP, para eleição de representantes na administração, mas com a alteração da palavra “exigem” por “requerem”.


[continua]
publicado por industrias-culturais às 08:23
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Domingo, 30 de Maio de 2004

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MEDIA DE PROXIMIDADE - II

Na sua tese de mestrado, Pedro Coelho (conhecido jornalista do canal televisivo SIC) escreve sobre media de proximidade, em especial a televisão. Próximo da definição de Carlos Camponez, que apresentei aqui ontem, os media de proximidade são aqueles que ligam uma comunidade humana de tamanho médio ou pequeno, com uma delimitação territorial e produzindo conteúdos relacionados com uma dada experiência quotidiana, um património linguístico, artístico e cultural, bem como uma memória histórica. Aos media de proximidade compete a denúncia dos problemas que afectam a comunidade e a promoção do debate e discussão com vista à sua solução.

Pedro Coelho fala das rádios locais e da televisão de proximidade. Abandonemos aquelas - espero retomá-la num dos próximos dias - e entremos na apreciação desta. A televisão de proximidade é colocada ao serviço da comunidade, "cúmplice do processo de desenvolvimento dessa comunidade" (p. 134) O autor dá exemplos de experiências de canais de televisão para condomínios, televisão universitária na Covilhã, televisão municipal de Évora e desdobramento das emissões da RTP em sete regiões, tudo já desaparecido.

Apesar de haver escassa informação, Pedro Coelho refere diversas experiências ocorridas na década de 80. Por exemplo, a TVAA, do Algarve (1980), as emissões que iam para o ar após o fecho dos programas da RTP, em 1983, em Évora, Espinho e Porto. Em 1984, no Porto, surgiu a TV Maravilha, chegando a ser captada durante alguns minutos. No ano seguinte, e ainda no Porto, a TVN (Televisão Regional do Norte) utilizou a frequência do canal 1 da RTP e na emissão participaram autoridades locais e eclesiásticas. Ainda em 1985, a partir da Cova da Piedade, e durante cinco meses, a Sul TV chegou a uma audiência de 20 mil telespectadores de Almada, Seixal e Barreiro. Mas houve também experiências a partir de Guimarães, Loures e Braga.

E Pedro Coelho destaca um homem - António Colaço, que já estivera por detrás do movimento das rádios locais, e hoje assessor de imprensa do partido Socialista. Associado a um movimento de cidadãos de Abrantes, colocou no ar a primeira emissão da TVA (Televisão de Abrantes). O tema central da primeira emissão foi a instalação polémica de uma central termoeléctrica na região (p. 154). O mesmo António Colaço apareceria ligado, em Abril de 1995, à TRP (Televisão Regional Portuguesa), a emitir a partir de um estúdio em Campo de Ourique, Lisboa. A emissão fôra anunciada quatro dias antes! O apresentador, de rosto semi-coberto, questionava a existência da liberdade de expressão audiovisual das regiões. No programa participariam ainda o actor Mário Viegas, o coronel Vasco Lourenço e o presidente da câmara de Constância, António Mendes.

Título da tese: A TV de proximidade e os novos desafios do espaço público (tese orientada por João Pissarra Esteves, professor da Universidade Nova de Lisboa, e escrita em 2003)

[este post deve ser lido em complemento e/ou associação ao que escrevi no passado dia 26]
publicado por industrias-culturais às 10:12
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MEDIA DE PROXIMIDADE - II

Na sua tese de mestrado, Pedro Coelho (conhecido jornalista do canal televisivo SIC) escreve sobre media de proximidade, em especial a televisão. Próximo da definição de Carlos Camponez, que apresentei aqui ontem, os media de proximidade são aqueles que ligam uma comunidade humana de tamanho médio ou pequeno, com uma delimitação territorial e produzindo conteúdos relacionados com uma dada experiência quotidiana, um património linguístico, artístico e cultural, bem como uma memória histórica. Aos media de proximidade compete a denúncia dos problemas que afectam a comunidade e a promoção do debate e discussão com vista à sua solução.

Pedro Coelho fala das rádios locais e da televisão de proximidade. Abandonemos aquelas - espero retomá-la num dos próximos dias - e entremos na apreciação desta. A televisão de proximidade é colocada ao serviço da comunidade, "cúmplice do processo de desenvolvimento dessa comunidade" (p. 134) O autor dá exemplos de experiências de canais de televisão para condomínios, televisão universitária na Covilhã, televisão municipal de Évora e desdobramento das emissões da RTP em sete regiões, tudo já desaparecido.

Apesar de haver escassa informação, Pedro Coelho refere diversas experiências ocorridas na década de 80. Por exemplo, a TVAA, do Algarve (1980), as emissões que iam para o ar após o fecho dos programas da RTP, em 1983, em Évora, Espinho e Porto. Em 1984, no Porto, surgiu a TV Maravilha, chegando a ser captada durante alguns minutos. No ano seguinte, e ainda no Porto, a TVN (Televisão Regional do Norte) utilizou a frequência do canal 1 da RTP e na emissão participaram autoridades locais e eclesiásticas. Ainda em 1985, a partir da Cova da Piedade, e durante cinco meses, a Sul TV chegou a uma audiência de 20 mil telespectadores de Almada, Seixal e Barreiro. Mas houve também experiências a partir de Guimarães, Loures e Braga.

E Pedro Coelho destaca um homem - António Colaço, que já estivera por detrás do movimento das rádios locais, e hoje assessor de imprensa do partido Socialista. Associado a um movimento de cidadãos de Abrantes, colocou no ar a primeira emissão da TVA (Televisão de Abrantes). O tema central da primeira emissão foi a instalação polémica de uma central termoeléctrica na região (p. 154). O mesmo António Colaço apareceria ligado, em Abril de 1995, à TRP (Televisão Regional Portuguesa), a emitir a partir de um estúdio em Campo de Ourique, Lisboa. A emissão fôra anunciada quatro dias antes! O apresentador, de rosto semi-coberto, questionava a existência da liberdade de expressão audiovisual das regiões. No programa participariam ainda o actor Mário Viegas, o coronel Vasco Lourenço e o presidente da câmara de Constância, António Mendes.

Título da tese: A TV de proximidade e os novos desafios do espaço público (tese orientada por João Pissarra Esteves, professor da Universidade Nova de Lisboa, e escrita em 2003)

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Na sua tese de mestrado, Pedro Coelho (conhecido jornalista do canal televisivo SIC) escreve sobre media de proximidade, em especial a televisão. Próximo da definição de Carlos Camponez, que apresentei aqui ontem, os media de proximidade são aqueles que ligam uma comunidade humana de tamanho médio ou pequeno, com uma delimitação territorial e produzindo conteúdos relacionados com uma dada experiência quotidiana, um património linguístico, artístico e cultural, bem como uma memória histórica. Aos media de proximidade compete a denúncia dos problemas que afectam a comunidade e a promoção do debate e discussão com vista à sua solução.

Pedro Coelho fala das rádios locais e da televisão de proximidade. Abandonemos aquelas - espero retomá-la num dos próximos dias - e entremos na apreciação desta. A televisão de proximidade é colocada ao serviço da comunidade, "cúmplice do processo de desenvolvimento dessa comunidade" (p. 134) O autor dá exemplos de experiências de canais de televisão para condomínios, televisão universitária na Covilhã, televisão municipal de Évora e desdobramento das emissões da RTP em sete regiões, tudo já desaparecido.

Apesar de haver escassa informação, Pedro Coelho refere diversas experiências ocorridas na década de 80. Por exemplo, a TVAA, do Algarve (1980), as emissões que iam para o ar após o fecho dos programas da RTP, em 1983, em Évora, Espinho e Porto. Em 1984, no Porto, surgiu a TV Maravilha, chegando a ser captada durante alguns minutos. No ano seguinte, e ainda no Porto, a TVN (Televisão Regional do Norte) utilizou a frequência do canal 1 da RTP e na emissão participaram autoridades locais e eclesiásticas. Ainda em 1985, a partir da Cova da Piedade, e durante cinco meses, a Sul TV chegou a uma audiência de 20 mil telespectadores de Almada, Seixal e Barreiro. Mas houve também experiências a partir de Guimarães, Loures e Braga.

E Pedro Coelho destaca um homem - António Colaço, que já estivera por detrás do movimento das rádios locais, e hoje assessor de imprensa do partido Socialista. Associado a um movimento de cidadãos de Abrantes, colocou no ar a primeira emissão da TVA (Televisão de Abrantes). O tema central da primeira emissão foi a instalação polémica de uma central termoeléctrica na região (p. 154). O mesmo António Colaço apareceria ligado, em Abril de 1995, à TRP (Televisão Regional Portuguesa), a emitir a partir de um estúdio em Campo de Ourique, Lisboa. A emissão fôra anunciada quatro dias antes! O apresentador, de rosto semi-coberto, questionava a existência da liberdade de expressão audiovisual das regiões. No programa participariam ainda o actor Mário Viegas, o coronel Vasco Lourenço e o presidente da câmara de Constância, António Mendes.

Título da tese: A TV de proximidade e os novos desafios do espaço público (tese orientada por João Pissarra Esteves, professor da Universidade Nova de Lisboa, e escrita em 2003)

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Pedro Coelho fala das rádios locais e da televisão de proximidade. Abandonemos aquelas - espero retomá-la num dos próximos dias - e entremos na apreciação desta. A televisão de proximidade é colocada ao serviço da comunidade, "cúmplice do processo de desenvolvimento dessa comunidade" (p. 134) O autor dá exemplos de experiências de canais de televisão para condomínios, televisão universitária na Covilhã, televisão municipal de Évora e desdobramento das emissões da RTP em sete regiões, tudo já desaparecido.

Apesar de haver escassa informação, Pedro Coelho refere diversas experiências ocorridas na década de 80. Por exemplo, a TVAA, do Algarve (1980), as emissões que iam para o ar após o fecho dos programas da RTP, em 1983, em Évora, Espinho e Porto. Em 1984, no Porto, surgiu a TV Maravilha, chegando a ser captada durante alguns minutos. No ano seguinte, e ainda no Porto, a TVN (Televisão Regional do Norte) utilizou a frequência do canal 1 da RTP e na emissão participaram autoridades locais e eclesiásticas. Ainda em 1985, a partir da Cova da Piedade, e durante cinco meses, a Sul TV chegou a uma audiência de 20 mil telespectadores de Almada, Seixal e Barreiro. Mas houve também experiências a partir de Guimarães, Loures e Braga.

E Pedro Coelho destaca um homem - António Colaço, que já estivera por detrás do movimento das rádios locais, e hoje assessor de imprensa do partido Socialista. Associado a um movimento de cidadãos de Abrantes, colocou no ar a primeira emissão da TVA (Televisão de Abrantes). O tema central da primeira emissão foi a instalação polémica de uma central termoeléctrica na região (p. 154). O mesmo António Colaço apareceria ligado, em Abril de 1995, à TRP (Televisão Regional Portuguesa), a emitir a partir de um estúdio em Campo de Ourique, Lisboa. A emissão fôra anunciada quatro dias antes! O apresentador, de rosto semi-coberto, questionava a existência da liberdade de expressão audiovisual das regiões. No programa participariam ainda o actor Mário Viegas, o coronel Vasco Lourenço e o presidente da câmara de Constância, António Mendes.

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Apesar de haver escassa informação, Pedro Coelho refere diversas experiências ocorridas na década de 80. Por exemplo, a TVAA, do Algarve (1980), as emissões que iam para o ar após o fecho dos programas da RTP, em 1983, em Évora, Espinho e Porto. Em 1984, no Porto, surgiu a TV Maravilha, chegando a ser captada durante alguns minutos. No ano seguinte, e ainda no Porto, a TVN (Televisão Regional do Norte) utilizou a frequência do canal 1 da RTP e na emissão participaram autoridades locais e eclesiásticas. Ainda em 1985, a partir da Cova da Piedade, e durante cinco meses, a Sul TV chegou a uma audiência de 20 mil telespectadores de Almada, Seixal e Barreiro. Mas houve também experiências a partir de Guimarães, Loures e Braga.



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